História em quadrinhos produzida para a pesquisa extraída de ACERVO issuu
Conclusões da autora
"No decorrer desta pesquisa, foi possível verificar, de forma sistemática, como está sendo desenvolvido o ensino da Geometria nos anos finais do Ensino Fundamental, nas escolas localizadas no centro de Pelotas. Nota-se que, dos cinco colégios investigados, dois realizam de forma satisfatória essa abordagem, um é minimamente suficiente e outros, nem isso. Sem a intenção de encontrar culpados locais, verificou-se que essa realidade se deve à própria história da organização escolar brasileira.
Pode-se destacar que o ensino da Geometria é relevante para a constituição cognitiva de qualquer pessoa. Isso porque se observa a presença de figuras em diversos locais, assim como a utilização da medição para, praticamente, todas as profissões. A expressão Geometria traz, em sua epistemologia, uma de suas aplicações: a medição de terra. Desde o antigo Egito, o ser humano utiliza esse recurso para auxiliá-lo em seu benefício ou lhe dar segurança de que não está sendo fraudado. Essa era a maior preocupação daquela época. Havendo as mudanças no nível do rio, teriam de pagar mais ou menos impostos.
Outro aspecto está relacionado à identificação de figuras, propriedades ou padrões que remete aos grandes estudiosos gregos que conseguiram chegar à forma de beleza até hoje reconhecida. Inúmeras construções, desde o Partenon (438 a. C.), a Catedral de NotreDame (1345), o prédio da Organização das Nações Unidas (ONU) ou obras de arte, como a Mona Lisa (de Leonardo Da Vinci), são formatadas por essa relação geométrica, na qual a razão (divisão) entre a altura e a largura dos objetos corresponde ao chamado número de ouro, isto é, a aproximadamente a constante 1,6180.
Além disso, mas não menos importante, o estudo das formas no ensino básico pode auxiliar no desenvolvimento da percepção espacial, relevante em diversas profissões, além da capacidade de abstração e generalização. Essas características eram defendidas por Euclides Roxo ao redigir a primeira reforma educacional. Os primeiros dois anos, um curso introdutório e os três últimos, com
essa meta. É bem possível perceber que essas habilidades contribuem também para o ensino da Álgebra, totalmente edificada nessas bases.
Apesar desses diversos aspectos elencadas acima, foi possível notar que o ensino da Geometria nas escolas investigadas limita-se a poucos (ou talvez, mínimos) movimentos de contextualização de sua prática. O que outrora estava relacionada a questões político-agrárias, na demarcação de propriedades, atualmente foi trocado por um desenhar ou recortar folhas, sem ou com baixa expressão para quem participa como sujeito de aprendizagem, ou seja, o aluno. E ainda, pôde-se notar que parte dessa “culpa” é atribuída pelos professores aos próprios discentes, quando afirmam que chegam às séries mais avançadas sem preparação, sem base dos conteúdos anteriores. Mas quem escolhe os modos de abordar? O que está faltando para que o enfoque seja renovado e a formação fique completa? Esses mecanismos de defesa podem subjetivar fragilidades de formação dos próprios educadores. Os cursos de graduação, ultimamente, também têm priorizado o enfoque nas disciplinas de Cálculo e de Álgebra, relegando à Geometria plana e espacial duas cadeiras no início da faculdade, com cargas horárias mínimas. Com uma rasa formação, torna-se difícil encontrar formas variadas de abordagem e, ainda mais, de explicação dos conteúdos. Isso porque, ainda que haja criatividade, faz-se necessário ter os conceitos bem edificados internamente para possuir repertório e ilustrar de formas diferentes, quando não há a compreensão discente.
É oportuno salientar que os próprios Parâmetros Curriculares Nacionais (BRASIL, 1998) oferecem sugestões de enfoque dos conteúdos. Neste trabalho proporcionou-se uma releitura da História da Matemática através dos quadrinhos, mas pode-se pensar na utilização de outras tantas metodologias como a etnomatemática, a resolução de problemas, a modelagem ou o uso das tecnologias, tais como os softwares, redes sociais e aplicativos. Essa escolha adequada depende do professor recuperar a curiosidade de conhecer o perfil de seus alunos. O que era eficiente para um determinado ano, pode não corresponder satisfatoriamente em outro.
Notou-se, pelos dados coletados, o não cumprimento do programa. Mas, se ele é pensado para o período de um ano e com conteúdos importantes para aquela etapa, a sua não concretização questiona o que está sendo trabalhado. Quem está estabelecendo esse currículo “paralelo” ao oficial? Evidencia-se, no momento, que o que está sendo ensinado foi passado por um colega que possuía a série anteriormente e que já havia realizado uma filtragem no programa, ou seja, é posto em prática um currículo “herdado”. Ele já está naturalizado no imaginário professoral. Pode-se pensar como um desafio atual, pelo menos na realidade encontrada, motivar o docente para que volte a ter atitude em suas práticas, rompendo com este, até então, já posto.
O seguimento de um programa oficial, padrão, mesmo que criticável sobre alguns aspectos, é considerado positivo do ponto de vista que cabe ao Estado compor essas normas e, assim, oportunizar possibilidades (até mesmo financeiras) para que elas sejam postas em prática e sejam cumpridas em sua totalidade. Todavia, esse documento também norteia e embasa avaliações nacionais e, na sua ausência, não haveria isonomia curricular entre os avaliados. O não cumprimento desse programa pode ser um dos motivos que gera os diversos e heterogêneos resultados obtidos nas provas realizadas nas escolas (Provinha Brasil, Prova Brasil, ENEM e ENAD).
Tendo consciência da realidade averiguada, ao concluir este curso de mestrado, aposta-se em duas ferramentas para minimizar essa problemática e contribuir para o seu desenvolvimento: a História da Matemática e os quadrinhos. Com a intenção de responder à segunda questão desta pesquisa, no primeiro capítulo desta dissertação, foi realizado um levantamento das potencialidades da História, entre as quais ficaram explícitas algumas, tais como: o entendimento da disciplina como criação humana e em desenvolvimento, não estando pronta desde sempre e aproximando-a dos alunos; o oferecimento de métodos de abordagem para o professor, por meio da pesquisa do surgimento da teoria em questão; a escolha de problemas práticos, isso porque alguém, algum dia, defrontou-se com a necessidade de respostas a um dado questionamento e isso pode ser o início de um estudo; a possibilidade da realização de um diálogo com outras áreas; e, ainda, o potencial motivacional, oportunizando um ritmo diferenciado da aula tradicional.
No caso da Geometria, ficam claras essas vantagens, lembrando inúmeros autores que deram seus nomes a teoremas e fórmulas, por exemplo: Geometria Euclidiana, Teorema de Tales, Teorema de Pitágoras, Sólidos de Platão e, assim, é possível ter acesso a tantos outros. A ideia de que homens (e, se possível, descobrir algumas mulheres) dedicaram-se ao estudo, para solucionar problemas é favorável ao fomento de “novas” perguntas e à busca de “novas” respostas. Essa inovação pode ser exclusiva para os alunos.
No que tange ao tema das Histórias em quadrinhos, apresentado na terceira questão da pesquisa, observou-se que a sua utilização para a comunicação de notícias e informações gerais, remete à pré-história, passando por diversos interesses (treinamento de tropas, catequese, difusão de políticas governamentais), além do ensino sistematizado de sala de aula e o entretenimento como um todo.
Na escola, ela é positiva, considerando a familiaridade dos alunos infanto-juvenis, sendo uma forma de incentivo à leitura, desenvolvimento de características como criatividade, análise e síntese, além de estar disponíveis para diversos níveis etários e de assuntos, podendo ser utilizado em diversos momentos, de acordo com a criatividade do professor. Com base nesse relato, pode-se entender que os objetivos traçados inicialmente foram alcançados. Porém, a fala, da professora de uma das escolas investigadas, pode servir como principal sentimento de dever cumprido. Ela afirmou:
Depois que eu estava fazendo esse trabalho contigo. A coordenadora – nem é a da área, mas a do currículo – ela viu a gente ali, conversando. Ela disse que está com vontade de mudar, pra ver se, tal vez, aumentando uma aula por semana, não sei, para conseguir abordar. Eles estão saindo prejudicados. Muitos vão fazer uma prova, uma seleção. [...] Em uma seleção sempre cai geometria, sempre! Aí, eles saem prejudicados, eu acho.
No transcorrer desse processe de pesquisa, de criação e recriação, de escrever, apagar e escrever novamente, um novo professor foi sendo constituído. Possibilitou-se o entendimento de que a sala de aula está aberta ao uso de diversas tecnologias e materiais. Um arejamento das metodologias aplicadas no cotidiano docente. O descobrir-se escritor, pesquisador, um pensador sobre a prática e um autoinovar potencialidades, tais como de investigar a História e elaborar roteiros (minimamente) suficientes para a criação de quadrinhos.
Fica, também, mais evidente, a necessidade de trabalhar em grupo. É possível reconhecer diversas mãos que contribuíram para a realização desta pesquisa. Os movimentos: orientadora e orientando; pesquisador e grupo de colegas de orientação; investigador e sujeitos da pesquisa; autor, cartunista e colorista. A dedicação e a superação de dificuldades como as jornadas de trabalho docente, cansaço, divisão do tempo em diversas frentes de atuação pessoal, guiaram o presente texto em conclusão.
Vale a pena, ainda, retomar e justificar minimamente a escolha da epígrafe desse trabalho, que versa sobre a alegria. Oferecer este almanaque para a utilização das escolas é motivo de gozo! É “sonhar” e “torcer” para que a Geometria possa relacionar-se com os alunos de uma maneira afável, amigável, aprazível, comprovando a afirmação dos PCN (BRASIL, 1998) de que ela é bem acolhida pelos discentes. Bem como, demonstrar aos colegas de área que movimentos são possíveis. A Matemática não é triste, sem graça, em preto e branco. Ela é radiante, colorida e se faz com júbilo diante de descobertas.
Concluindo esta dissertação e este Mestrado profissional em Ensino de Ciências e Matemática, estará sendo encaminhado, às escolas e a Secretaria Municipal de Educação e Desporto, o panorama apresentado, bem como o produto. Dessa forma, será possível que todos os que contribuíram ou outros possam sentir-se motivados a repensar suas práticas do ensino de Matemática, em especial de Geometria. E, ainda, sintam-se contagiados pela possibilidade da utilização da História da Matemática e dos quadrinhos, juntos ou individualmente."
Texto extraído de: Acervo UFPE
Dissertação
Artigos:
Um diálogo das teorias curriculares com a história da matemática em quadrinhos
Lupi Scheer dos Santos; Carla Goncalves Rodrigues; Josimara Wikboldt Schwantz
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